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      Processo de maturação vira trunfo de produtores para aprimorar sabor e agregar valor ao queijo

      Quanto mais velho melhor! A frase resume bem no que consiste o processo de transformação química que resulta na maturação do queijo. Quanto maior o tempo de maturação, mais firme e mais saboroso fica o queijo. Alguns ficam meses e até anos passando pelo processo antes de serem consumidos.

      Durante a maturação, milhões de microorganismos e enzimas atuam quebrando moléculas de proteínas e gorduras, resultando em uma complexa combinação de substâncias que influenciam na textura, sabor e aroma do queijo. Aspectos como temperatura, umidade e ventilação atuam diretamente no processo de maturação.

      “Hoje a ciência mostra que aquela flora microbiana existente no queijo, dia após dia, faz ele entrar em um processo de mudança de composição orgânica e sensorial. Há uma mudança na composição química desse produto, que fica nutricionalmente melhor”, explica o presidente da Associação dos Produtores da Canastra, a Aprocan, João Carlos Leite.

      Segundo Leite, essa capacidade do queijo de se transformar e ficar ainda melhor com o passar do tempo mudou a relação do homem, milênios atrás, com o leite, um dos mais importantes alimentos do mundo.

      “Ele descobriu que o leite não era passível de ser armazenado, mas que o queijo era. É uma forma física diferente de armazenamento do leite. Ele descobriu que o queijo podia ficar anos a fio passível de ser comido, de ser um alimento. Descobriu que quanto mais velho o queijo ficava, mais gostoso era, que ele adquiria formas sensoriais diferentes”, explica o presidente da associação, que também é estudioso sobre o tema.

      Queijos no ‘berçário’

      Para quem produz queijo, o produto é quase uma obra de arte e, por quê não dizer, quase como um filho. Tanto que para alguns produtores, as salas de maturação, onde são desenvolvidas as características de cada queijo, funcionam como ‘berçários’.

      “Aqui nós tratamos desse queijo, mesma coisa de uma criança. Vira, limpa, dependendo do queijo ele não pode desenvolver mofo demais, tem que passar um produto. Dependendo do queijo ele é pintado, tem que ir virando ele todo dia. A temperatura é controlada, não pode ter muita oscilação, porque senão o queijo não dá o paladar que ele precisa”, conta o queijeiro Anderson Pereira Maciel, de Cruzília.

      “A gente fala que aqui é o berçário onde a gente cuida das nossas crianças” , afirma produtor.

      Segundo Maciel, há processos de maturação diferentes dependendo do tipo de consumo.

      “Esse é um parmesão com gosto mais apurado, que já começa a criar pedrinhas de tirosina, que são pequenas pedras de cristal. É um queijo que tem um gosto mais apurado, para o pessoal que gosta de um queijo para tomar com uma cerveja, o pessoal que gosta de um queijo mais picante. Esse outro, já desenvolveu a olhadura, já está pronto para ir ao mercado, tem um gosto adocicado, é um queijo para quem quer tomar um vinho, para uma tábua de frios”, explica.

      Sala de maturação é como um berçário para os queijos, diz produtor — Foto: Fernanda Rodrigues

      Benefícios da maturação

      Além de alterar o sabor, o processo de cura do queijo interfere diretamente nos nutrientes e em como o produto afeta a saúde dos consumidores. De acordo com a nutricionista Ana Carolina Palmutti, especializa em nutrição funcional, um queijo meia-cura é o mais indicado em termos de saúde.

      “Hoje a recomendação mais atual que a gente tem é para buscar os de meia cura (ponto intermediário entre um queijo fresco e maturado). Porque aí realmente são mais funcionais, passam por aquele processo mais natural de desnaturação de caseína, de fermentação de lactose, então torna-se um queijo menos agressivo, com menos aditivos químicos. Um processo estritamente artesanal, que é o que a gente tem buscado na nutrição hoje”, explica.

      Ainda conforme a nutricionista, quanto mais tempo o queijo for maturado, menos lactose ele vai ter, podendo chegar a ter quantidades insignificantes do açúcar.

      “Quanto mais tempo ele fica in natura, mais tempo fermenta a lactose. Então quanto mais maturado, menor o teor de lactose. Alguns queijos mais maturados chegam a ser zero lactose naturalmente, sem a adição de enzima”, diz Ana Carolina.

      Queijo artesanal meia cura é indicado por nutricionista — Foto: Régis Melo

      Valor de mercado

      O processo de maturação também passou a influenciar nos preços da iguaria. O queijo maturado utiliza em média mais litros de leite por quilo do produto final – durante o processo de cura, alguns queijos chegam a perder até 20% de volume. No entanto, essa redução acaba compensada pelo valor agregado ao produto.

      “Uso entre 11 e 12 litros de leite por quilo. Isso um queijo um pouco mais fresco, no caso. Se for um queijo maturado, aí gasta mais. Um queijo de 3,2 kg, vem para 2,6 kg. Isso com três meses mais ou menos de maturação”, ressalta o produtor Francisco de Franco Maciel Lopes, que produz Queijo Artesanal da Mantiqueira.

      “Ele vai mudando, vai ficando seco. Ele vai secando cada dia mais. Aquele queijo, agora, já não amassa mais. E é um queijo muito gostoso. Vai saindo a água que tem nele, não tem o que faça. Mas ganha qualidade. Um queijo desse no mercado, é um queijo caro”, diz o produtor Caíque Soares de Barros, que produz Queijo Artesanal de Alagoa.

      De acordo com o técnico da Júlio Fleming, da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater–MG), esse entendimento fez com que os produtores mudassem a forma de ver o próprio mercado.

      “O queijo era vendido como uma commodity. Então o comprador chegava, comprava queijo ali quinzenalmente e ele dava o preço do queijo. Era o comprador que determinava o preço. ‘Hoje o queijo está valendo R$ 10. Hoje o queijo está valendo R$ 9′. Com o tempo, o produtor foi vendo que o produto dele é um produto diferenciado, não é uma commodity, é um produto único. Como um vinho francês. E aí ele passou a colocar o preço dele”, conclui.

      Da Redação com informações do G1

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